Descendentes de aves ameaçadas de extinção resgatadas há duas décadas por causa da Usina de Porto Primavera são soltos na natureza


Projeto de Soltura do Mutum-de-Penacho, desenvolvido pela Cesp, permitiu a reprodução em cativeiro, com o acompanhamento de equipe técnica e qualificada. Projeto de Soltura do Mutum-de-Penacho é uma iniciativa para a preservação da espécie na área de influência da Usina Hidrelétrica de Porto Primavera
Luciano Candisani
A Companhia Energética de São Paulo (Cesp) concluirá neste mês de dezembro a soltura na natureza de um total de 40 aves da espécie mutum-de-penacho (Crax fasciolata) na área de influência da Usina Hidrelétrica Engenheiro (UHE) Sérgio Motta, que fica no Rio Paraná, no distrito de Porto Primavera, em Rosana (SP).
A ação faz parte do projeto de Soltura do Mutum-de-Penacho, uma iniciativa da empresa, que é uma subsidiária integral da Auren Energia, para a preservação dessa espécie na região.
De acordo com o gerente de Sustentabilidade e Operações da empresa, André Rocha, os animais que estão sendo colocados na natureza são descendentes de indivíduos resgatados há cerca de duas décadas pela própria companhia, durante a construção do reservatório da usina.
Na época, foram resgatadas cerca de 140 aves, sendo a grande maioria solta na natureza e levada para instituições como zoológicos e centros de conservação.
O restante, em torno de 40 indivíduos, foi encaminhado para o Centro de Conservação de Aves Silvestres (CCAS), da Usina Hidrelétrica de Paraibuna, em Paraibuna (SP), que fica no Vale do Paraíba, a mais de 900km de distância de Rosana, visando à proteção da espécie por meio da reprodução em cativeiro, com o acompanhamento de equipe técnica e qualificada.
“A Cesp tem o compromisso com a conservação da biodiversidade e proteção dos nossos recursos naturais. Faz parte do nosso negócio. Por isso, mantemos várias ações com o objetivo de promover a preservação da fauna e da flora na região, que incluem ações de manejo e proteção de Unidades de Conservação e APPs [Áreas de Preservação Permanente] e de reflorestamento de regiões degradadas, visando, principalmente, à criação de corredores ecológicos para auxiliar na proteção de animais silvestres”, destaca Rocha.
“Por isso, é com muito orgulho que dizemos que, depois de 20 anos de muita dedicação e cuidados, essas aves tão importantes para o equilíbrio ambiental dos biomas estão retornando para casa”, complementa ele.
Projeto de Soltura do Mutum-de-Penacho é uma iniciativa para a preservação da espécie na área de influência da Usina Hidrelétrica de Porto Primavera
Luciano Candisani
Devido aos cuidados que a operação envolve, o processo de soltura dos animais foi dividido em duas etapas.
Na primeira delas, iniciada no dia 26 de outubro, foram transferidos 20 animais da UHE Paraibuna: dez seguiram para a Área de Soltura e Manejo de Fauna da Fazenda Cisalpina, Unidade de Conservação da Cesp no município de Brasilândia (MS), e outros dez, para a Área de Soltura e Manejo de Fauna da Foz do Rio Aguapeí, em Castilho (SP).
Para receber os animais, dois viveiros semelhantes ao existente no CCAS, com 17 metros de comprimento, por 4,5 metros de altura e 7,8 metros de largura, foram construídos nas duas propriedades com o objetivo de facilitar o processo de adaptação das aves.
“Esta é uma ação bastante complexa. Vai muito além de pegar essas aves do viveiro e soltar na natureza. O projeto começou com meses de antecedência, com a construção dos viveiros, estudos e planejamento estratégico. Depois, iniciamos as avaliações constantes dos animais, incluindo exames médicos e treinamentos comportamentais, visando a garantir que eles estejam saudáveis e aptos para a soltura”, salienta Rocha.
“A viagem da UHE Paraibuna, no Estado de São Paulo, até a Reserva Cisalpina também teve atenção especial, com contratação de empresa especializada no transporte de animais silvestres, e foi realizado no período noturno, tudo para reduzir qualquer estresse dos animais e garantir que eles cheguem bem e saudáveis”, detalha.
Já nas duas áreas de soltura e manejo, a equipe técnica do projeto, que envolve biólogos e veterinários, continuou com o processo de adaptação e treinamento dos animais.
A segunda fase do projeto está prevista iniciar neste mês e consistirá na transferência de mais 20 indivíduos de mutum-de-penacho. Assim como na primeira etapa, serão soltos dez em Brasilândia e outros dez em Castilho.
Projeto de Soltura do Mutum-de-Penacho é uma iniciativa para a preservação da espécie na área de influência da Usina Hidrelétrica de Porto Primavera
Luciano Candisani
Soltura branda
No dia 26 novembro, após um período de quarentena das aves, foi iniciada a ação de soltura branda. Nesta etapa, as portas do viveiro foram abertas e as aves continuam recebendo alimentação dos tratadores – os alimentos são escondidos na mata para incentivar a integração dos pássaros ao ambiente – até que o viveiro seja por fim fechado.
Antes disso, porém, todos os indivíduos receberam equipamentos radiotransmissores no dorso, para que possam ser monitorados pela equipe responsável.
Projeto de Soltura do Mutum-de-Penacho é uma iniciativa para a preservação da espécie na área de influência da Usina Hidrelétrica de Porto Primavera
Luciano Candisani
Ameaça de extinção
Para o pesquisador Sérgio Posso, professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), especialista em ornitologia e coordenador do projeto, a ação de soltura dos mutuns-de-penacho só tem a enriquecer a fauna das regiões leste de Mato Grosso do Sul e oeste de São Paulo.
O pesquisador explica que essa espécie já é considerada ameaçada em diversas regiões do país, principalmente na região Sudeste, em estados como Espírito Santo, Minas Gerais e São Paulo, onde a classificação é de criticamente em perigo.
Em outras regiões, sobrevivem somente pequenos grupos, o que aumenta as chances de extinção, uma vez que, além da redução da variabilidade genética, a ave também é alvo de caça predatória e de ataques de animais domésticos.
“Como existem somente pequenos grupos, se reproduzindo entre si, podem ocorrer problemas genéticos e o enfraquecimento dos indivíduos, o que, somado aos outros riscos, entre eles a caça predatória, pode levar ao seu desaparecimento. A vinda de novos indivíduos, com novos genes, só tem a agregar para a diversidade genética e aumentar a população dessa espécie na região”, reforça o pesquisador.
Projeto de Soltura do Mutum-de-Penacho é uma iniciativa para a preservação da espécie na área de influência da Usina Hidrelétrica de Porto Primavera
Luciano Candisani
Reflorestador natural
Com cerca de 60 centímetros de altura e pesando de 2,5 a 3 quilos, o mutum-de-penacho também é conhecido por ser um excelente dispersor de sementes.
Como se trata de um animal de solo – ele sobe em árvores somente para dormir –, o mutum se alimenta de pequenos insetos e de sementes de árvores, o que ajuda a disseminá-las pela região.
“Além de extremamente bonita, essa ave é muito importante para o equilíbrio ambiental. Por isso, ações como esta da Cesp são extremamente importantes para a conservação e o aumento da população da espécie e da biodiversidade como um todo, levando em consideração a importância dessa ave para o reflorestamento. Hoje, em Mato Grosso do Sul, ainda há muitos animais, mas não podemos repetir os mesmos erros cometidos por outras regiões no passado”, salienta Posso.
Projeto de Soltura do Mutum-de-Penacho é uma iniciativa para a preservação da espécie na área de influência da Usina Hidrelétrica de Porto Primavera
Luciano Candisani
Projeto de Soltura do Mutum-de-Penacho é uma iniciativa para a preservação da espécie na área de influência da Usina Hidrelétrica de Porto Primavera
Luciano Candisani
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Luciano Candisani
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