Na batida do coração, Drik Barbosa reflete quebra da corrente machista em ‘Espelho’


Em um mundo ideal que equilibrasse igualitariamente o poder masculino e a força feminina na indústria da música, Drik Barbosa deveria estar lançando o primeiro disco solo – Espelho, EP com cinco músicas autorais de autoria da emergente rapper paulistana de 25 anos, compositora desde os 14 – sem depender do esquema empresarial de dois manos amigos e simpatizantes da causa feminista, Emicida e Evandro Fióti, diretores da gravadora, Laboratório Fantasma, que põe o disco (em edições digital e física) de Drik no mercado em parceria com a Pomm_elo.
Contudo, no mundo real, as mulheres ainda são minoria no universo do hip hop e, em maioria, dependem do aval de colegas mais bem-sucedidos, como Emicida, para ganhar visibilidade. Foi assim com Drik, projetada de forma mais ampla na cena através de sucessivas gravações feitas com Emicida desde 2015.
Só que a rapper – vista ao alto em foto de Luciana Faria – tem voz própria. Uma voz ativa, já ouvida nas gravações do coletivo feminino Rimas & Melodias. Tanto que o EP Espelho também reflete a libertação da mulher que se desprende das correntes machistas, como rima Drik em Camélia (Drik Barbosa e Grou), rap contundente em que, sobre a batida do parceiro Grou (produtor de quatro das cinco faixas do disco), a artista cita nominalmente a cantora norte-americana Nina Simone (1933 – 2003) e a atriz carioca Taís Araújo no discurso que celebra o progressivo empoderamento feminino das mulheres negras nas artes e na sociedade.
A rapper Drik Barbosa
Divulgação Laboratório Fantasma / Luciana Faria
Sim, Drik Barbosa também bate na necessária tecla do racismo. Aliás, a rapper já foi direto ao assunto no primeiro (brilhante) single do EP, Melanina (Drik Barbosa, Deryck Cabrera, Grou e Rincon Sapiência), única faixa do disco que tem produção musical assinada por Deryck Cabrera. “A ginga predomina / Não mexe com as minas / Não mexe com as pretas na pista”, avisa Drik, imperativa, na faixa composta e gravada com a adesão do rapper Rincon Sapiência.
Ter poder feminino no rap é ter o direito de seguir a batida do coração, como Drik deixa claro em outro verso do EP. O que justifica a amenização do discurso no R&B romântico Inconsequente (Drik Barbosa, Grou e Dcazz), música com menor poder de sedução no conjunto do repertório do EP, e em Banho de chuva (Drik Barbosa e Grou), tema em que a rapper versa sobre a dureza da vida com sensibilidade e sem a virulência (também por vezes necessária) dos manos do hip hop.
Capa do EP ‘Espelho’, de Drik Barbosa
Divulgação / Laboratório Fantasma
Na autobiográfica música-título Espelho, Drik dá voz a MC Stefanie, parceira da rapper, do beatmaker produtor Grou e de Emicida na composição desse rap com toque de R&B que funciona como carta de princípios de Drik. Stefanie adensa o discurso, suavizado pela batida do coração da anfitriã. “Por onde passei, deixei rastros de amor”, inventaria Drik Barbosa, promissora voz feminina e afetiva do hip hop brasileiro.
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