Lenda da ‘mulher de branco’ que assombra fortaleza histórica atrai turistas e curiosos em Cabedelo, PB


Mito inspira roteiro assombrado, uma visitação noturna à Fortaleza de Santa Catarina com encenação teatral. Quadro da ‘Mulher de Branco’ em exposição na Fortaleza de Santa Catarina, em Cabedelo, na PB
Gabriella Loiola/g1 PB
Quem foi Branca Dias? A história para além do mito
A aparição fantasmagórica de uma bela mulher usando um vestido branco está presente no imaginário da população de Cabedelo, na Grande João Pessoa. A lenda da mulher de branco que assombra a Fortaleza de Santa Catarina – construção datada do século 16, na época do Brasil Colônia – tem várias versões e atrai turistas e curiosos para saber mais sobre o mito.
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A mulher de branco, ilustrada em um quadro em exibição na fortaleza, é uma lenda bem conhecida dos funcionários do forte e da população ao redor do local. Há quem diga que já viu Branca Dias, possível nome do fantasma em vida, e outros que desejam nunca ter um vislumbre da moça.
Robson Batista, que trabalha na fortaleza há 30 anos como guia, afirma que o quadro da mulher chorando com o carrasco atrás dela foi inspirado pelas histórias relatadas pelos vigias noturnos, que vivenciaram experiências sobrenaturais.
“Quando estavam aqui no forte à noite trabalhando, aparecia uma mulher caminhando pela parte de cima da praça de guerra, no túnel que dá acesso ao rio ou na parte de cima da casa do comandante. Todos eles viam uma mulher belíssima vestida de branco que desaparecia quando eles se aproximavam”, relata Robson.
Visão noturna da Fortaleza de Santa Catarina, em Cabedelo, Paraíba
Reprodução/TV Cabo Branco
Cristina Carvalho, que é recepcionista da Fortaleza, afirma que nunca viu e prefere que continue assim. “Tem gente que vê, principalmente quem fica aqui a noite. O senhor que fecha o forte à noite, seu Antônio, contou que já viu a mulher de branco”, relata.
Para tranquilizar Cristina, o guia turístico Renato Oliveira explica uma das versões do mito que assombra o local.
“Dizem que só homens podem ver a mulher de branco”, conta ele.
Segundo Osvaldo Carvalho, presidente da Fundação Fortaleza de Santa Catarina, o quadro foi feito pela artista Bela Santiago. Ela procurou colocar na tela a visão dela sobre a lenda da mulher de branco: uma figura de pele pálida, usando um vestido branco rasgado, de pés descalços e seguida por uma figura sombria.
Osvaldo relata que entre a década de 1940 e 1950, um boato se espalhou entre as pessoas que botijas com ouro tinham sido enterradas na fortaleza. Foi durante a caça às botijas, que a lenda da mulher de branco ganhou força.
Lenda da mulher de branco inspira espetáculo teatral realizado em visitação noturna à Fortaleza de Santa Catarina, na PB.
Divulgação/Sebrae PB
Os corajosos o suficiente para procurar o ouro, viam uma mulher de branco esperando na frente da fortaleza. Os homens a seguiam e entravam no forte.
“Ela ficava sentada na beira do poço, quando a pessoa se aproximava, ela caminhava em direção ao túnel, que dá acesso ao rio Paraíba. Ao chegar na entrada do túnel, a mulher desaparecia. É o que o pessoal conta”, detalha Osvaldo.
Robson relata que em uma das versões da lenda, a figura que assombra o local é o fantasma de uma jovem judia, que teve o engenho onde morava atacado pelo exército holandês e um grupo de indígenas. Todos foram mortos, mas pela beleza extraordinária, a moça foi poupada.
“O comandante se apaixona pela moça, mas ela não tem interesse por ele e para se vingar, ele a entrega aos soldados. Algumas pessoas contam que após isso ela foi jogada no poço e outras, que após tentar diversas vezes fazê-la corresponder aos sentimentos, o comandante a assassina”, conta.
Visão noturna da Fortaleza de Santa Catarina, em Cabedelo, Paraíba
Reprodução/TV Cabo Branco
Em outra versão, a mulher de branco ganha o nome de Branca Dias, uma jovem camponesa que foi alvo da paixão do Capitão Mor da Fortaleza de Santa Catarina.
Insatisfeito com a rejeição amorosa, assassinou toda a família dela e a levou presa para o forte, a condenando a viver a eternidade ao seu lado.
Dark turismo
Grupo de teatro e pesquisa Lendários encenam lendas do imaginário local ambientadas na fortaleza
Igobergh Bernardo/Arquivo pessoal
O “dark tourism” ou “turismo assombrado”, é uma vertente do turismo que utiliza a memória de locais, relacionada a eventos sombrios como batalhas ou morte, e promove atividades educativas, culturais e de entretenimento.
A Fortaleza de Santa Catarina, erguida em meados de 1580, serviu para defender o litoral dos ataques de holandeses e franceses. Segundo Igobergh Bernardo, diretor do Grupo de Teatro e Pesquisa Lendários e secretário de cultura do município de Cabedelo, a fortaleza é um desses espaços.
“Houve muitas mortes ali. O dark turismo fala sobre espaços imersos em memórias sombrias. A gente não discute religião, mas é um espaço místico por estar relacionado a momentos sombrios. Pode haver a presença de espíritos, então é utilizado o imaginário do público que vai lá para acompanhar a encenação”, explica Igobergh.
Nos dias 10 e 11 de novembro, a Fortaleza de Santa Catarina realiza uma visita noturna guiada ao prédio histórico, com encenação das lendas passadas de geração em geração e que estão vivas no imaginário popular, como “A mulher de Branco”, “Capitão Mor”, “Batatão”, “Cumadre Florzinha”.
Além do espetáculo teatral, o público também tem a oportunidade de assistir a apresentação do musical “Viva a Nau Catarineta”.
“A gente cresceu na verdade ouvindo essas narrativas. Ela [a mulher de branco] aparece para algumas pessoas, tem vários relatos de quem já viu. A gente enquanto grupo, já ouviu relincho de cavalos e sons de correntes sendo arrastadas pelos corredores”, relata Igobergh.
A turismóloga Vera Simões, que faz parte do Lendários e já está acostumada com o espetáculo, teve algumas experiências assustadoras no local.
“Quando começa e está tudo escuro com os personagens atuando, a gente é tomado por uma sensação de medo, porque você não sabe o que vai acontecer. Como eu ficava atrás para evitar que o grupo dispersasse, comecei a ficar meio assombrada e nos primeiros espetáculos, a sensação é que tinha mais pessoas no local além do grupo e do público”, relata.
Roteiro assombrado na Fortaleza de Santa Catarina, na PB, encena lendas locais como ‘A mulher de Branco’, ‘Capitão Mor’, ‘Batatão’, ‘Cumadre Florzinha’.
Igobergh Bernardo/Arquivo pessoal
Quem foi Branca Dias? – A história para além do mito
A real Branca Dias existiu no século 16, no período do Brasil colônia. Ela era uma judia portuguesa processada pelo Santo Ofício, acusada de praticar o judaísmo em segredo em Portugal. Branca foi presa pela inquisição após denúncia feita pela mãe e irmã.
A mulher não morreu pela inquisição, mas embarcou para o Brasil ao encontro do marido, Diogo Fernandes, que tinha vindo para o país um tempo antes para viver em Pernambuco.
Branca foi primeira mulher portuguesa a manter uma sinagoga em suas terras, uma das primeiras senhoras de engenho após a morte do marido e fundou uma escola para moças, onde ela ensinava boas maneiras e tarefas domésticas para meninas.
Não há registro histórico de que Branca Dias tenha morrido das formas relatadas nas diversas versões contadas sobre a “mulher de branco” e nem que ela viveu em Cabedelo.
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