MP abre inquérito para apurar frequentes mudanças em delegacia que combate crimes tributários no AC


Suspeita do órgão é que alterações constantes feitas pelo Delegado-Geral Henrique Maciel têm causado lentidão em investigações da Delegacia Especializada de Repressão a Crimes Fazendários (DEFAZ). Delegado diz que não foi notificado pelo MP e afirma que não interfere na condução de qualquer investigação criminal. MP-AC atribui constantes mudanças à direção-geral da Polícia Civil, comandada por José Henrique Maciel
Nilton Boscaro/Arquivo pessoal
O Ministério Público do Acre (MP-AC) instaurou um inquérito civil para apurar frequentes mudanças na estrutura organizacional da Polícia Civil do estado, especialmente da Delegacia Especializada de Repressão a Crimes Fazendários (DEFAZ). Conforme publicação no Diário Eletrônico do MP-AC dessa terça-feira (31), a suspeita do órgão é que alterações constantes feitas pelo delegado-geral José Henrique Maciel têm causado lentidão em investigações da unidade.
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O MP-AC classifica as mudanças como “recorrentes e deliberadas”, e diz que a paralisação de investigações prejudica a eficiência do poder público na apuração de crimes tributários.
“As citadas alterações na Unidade Policial, outrora conhecida como Grupo de Enfrentamento aos Crimes Contra a Ordem Tributária – GECOT e atualmente denominada Delegacia Especializada de Repressão a Crimes Fazendários – DEFAZ, vem resultando em morosidade excessiva na conclusão dos cadernos policiais, bem como no deliberado enfraquecimento das estratégias de repressão aos crimes contra a ordem tributária e conexos’, diz a publicação.
O procedimento, aberto pela Promotoria de Justiça Especializada de Combate à Evasão Fiscal, determina a realização de visita técnica à unidade para verificar a composição da equipe policial, investigações em andamento e concluídas, banco de horas, e veículos à disposição da unidade, e requisita que fotografias sejam feitas do local.
Ao fim da apuração, o MP-AC vai decidir se cabe ajuizar ação civil pública, ou se pedirá o arquivamento dos autos.
O que diz o delegado-geral
Ao g1, José Henrique Maciel informou que tem conhecimento da abertura do inquérito, mas que ainda não foi formalmente notificado. Ele diz que recebe a abertura do procedimento com tranquilidade, e que responderá todos os questionamentos que forem feitos à direção-geral.
“Em nenhum momento, antes da abertura do inquérito civil, fui procurado ou oficiado acerca de qualquer situação irregular e/ou estrutural, referente ao GECOT, que foi transformado na nossa gestão em uma delegacia especializada, a DEFAZ. Entendo que só iniciei melhoria estrutural quando foi criada, via decreto governamental, a delegacia especializada em substituição ao grupo GECOT, e logo em seguida uma portaria que regulamenta suas atribuições. Inclusive com competência estadual e não apenas da capital”, disse.
O delegado-geral também ressaltou o decreto 11.303, que inclui a DEFAZ entre as unidades policiais do estado. Além disso, o mesmo decreto também dispõe sobre a Divisão Estadual de Investigações Criminais (DEIC).
José Henrique Maciel afirma que a legislação garante que as unidades tenham seus mecanismos internos de gerência, e que não haja interferência da direção-geral.
“O delegado-geral não interfere em nada na condução de qualquer investigação criminal. Inclusive, os atuais policiais civis que lá se encontram são da época em que assumi a PCAC, em abril de 2022, com exceção do delegado titular”, acrescentou.
Denúncias anteriores
O inquérito do MP-AC é um novo capítulo em uma série de alegações feitas contra o delegado-geral. Em outubro, a deputada Michelle Melo (PDT) apresentou durante sessão na Assembleia Legislativa do Acre (Aleac) documentos que, segundo ela, indicam que Maciel burlou a fila dos precatórios ao obter um acordo extrajudicial com a Procuradoria-Geral do Estado (PGE-AC). O governo afirma que o processo foi arquivado pelo MP. O órgão não confirmou o arquivamento para o g1.
A documentação mostra o pagamento de R$ 211 mil solicitados, segundo a parlamentar, de maneira indevida por Maciel. À época das denúncias, ele confirmou ter conversado com o servidor sobre a denúncia de rachadinha, mas disse que seu objetivo era saber quais eram as alegações contra ele. Ainda conforme o delegado-geral, que negou as acusações, as denúncias eram infundadas, e falou ainda que a conversa foi gravada sem seu consentimento.
Conforme os relatos apresentados pela parlamentar, em 2018, quando ainda não era delegado-geral, Maciel redigiu uma petição inicial para receber por 13 dias de férias das quais ele não usufruiu. Quando a Justiça retornou a solicitação, Maciel informou que desejava desistir da ação. Em 2020, ainda conforme a denúncia, ele conseguiu um acordo extrajudicial com a PGE-AC para receber a quantia.
De acordo com Michelle, essa movimentação mostra que o delegado quis “furar a fila” dos precatórios. Geralmente, os precatórios são pagos a servidores quando eles se aposentam e ainda possuem férias ou licenças das quais não usufruíram, e existe uma ordem para esse pagamento, e os servidores precisam aguardar a vez.
Áudios revelam conversa entre delegado-geral e servidor da Polícia Civil
Áudios de conversas
O g1 também teve acesso a outras denúncias envolvendo o delegado-geral, desde assédio moral à perseguições dentro da Polícia Civil. A reportagem teve acesso a uma conversa gravada entre um agente de Polícia Civil e o delegado. O ano foi 2020 e o agente foi chamado após ser ouvido em uma investigação sobre um suposto esquema de ‘rachadinha’ feito por Maciel. Ele chegou a ser afastado da delegacia geral por dois anos, mas retornou em 2022.
Na época, mesmo diante dos impasses, o governo disse em nota que confiava na idoneidade e competência do delegado-geral para exercer a direção da Polícia Civil. No áudio, o delegado intimida o servidor dizendo que tem informações de supostas irregularidades que ele não foi atrás, diz que vai transferir delegados e que não há ninguém para ir contra ele, que é o delegado geral. (Ouça trechos acima)
Além disso, na denúncia recebida pelo g1, há notícias de servidores afastados com problemas psicológicos que sofreram assédio moral e também sexual.
Sobre essas denúncias, Maciel também nega qualquer prática inadequada. Ele confirmou ter conversado com o servidor sobre a denúncia de rachadinha, mas disse que, à época, seu objetivo era saber quais eram as alegações contra ele. Ainda conforme o delegado-geral, as denúncias eram infundadas, e que a conversa foi gravada sem seu consentimento.
“Houve uma conversa, a minha conversa é porque ele me denunciou sem prova nenhuma, e eu chamei ele para uma conversa. Eu perguntei o que ele tinha contra mim. Se ele entendeu como intimidação, o objetivo da conversa não era nesse sentido. Ele era chefe do transporte, ele foi o cara que me denunciou sem eu saber, sem nenhuma prova. E eu chamei ele para uma conversa, e ele, de forma antiética, me gravou sem meu conhecimento. Não estava sabendo, me gravou, de forma leviana, e eu não disse nada ali que pratiquei algum crime, ou tenha pedido para ele. Inclusive, falei no Ministério Público. Estão buscando uma coisa de 2019, 2020. Há um processo agora de denegrir a minha imagem”, rebate.
Em relação aos relatos de que persegue servidores que discordam dele e de assédio moral e sexual, ele também nega. Maciel afirma não ter conhecimento dos casos, e diz que precisaria saber quem é cada servidor para esclarecer o que houve.
Ele argumenta ainda que, muitas vezes, conversas rotineiras com servidores podem ser entendidas como assédio.
VÍDEOS: g1
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