‘Mussum – O filmis’ diverte e emociona ao contar a história do popular trapalhão; g1 já viu


Ailton Graça é o grande destaque como o personagem-título. Primeiro filme de Silvio Guindane como diretor foi grande vencedor do Festival de Gramado com seis Kikitos. Da atual onda de cinebiografias dos últimos anos, “Mussum – O filmis” se revela como uma das melhores. O longa, com estreia nesta quinta-feira (2), não tem novidades na forma de contar sua história. Mas compensa isso com um ótimo trabalho de todos no projeto: a equipe busca entender e reverenciar o homem por trás do popular cantor e humorista, sem parecer apelativo ou “chapa branca”.
Inspirado no livro no livro “Mussum – uma história de Humor e Samba”, de Juliano Barreto, o roteiro é dividido em três etapas. A primeira mostra a infância pobre de Antonio Carlos Bernardes Gomes, quando ainda era Carlinhos (vivido por Thawan Lucas Bandeira) e vivia com sua mãe, Dona Malvina (Cacau Protásio). Ainda criança, ele já mostrava aptidão para a música (embora quisesse ser jogador de futebol), apesar da desaprovação da mãe.
A segunda parte mostra Carlinhos já adulto (Yuri Marçal), seguindo carreira na Aeronáutica, ao mesmo tempo em que começava a tocar na noite com o grupo Os Originais do Samba, escondido dos familiares. É nessa época que ele conhece sua primeira esposa, Nely (Jeniffer Dias) e começa a construir sua própria família.
Assista ao trailer de ‘Mussum – O filmis’
Na terceira fase, agora Carlinhos (Ailton Graça) ganha destaque com suas participações na TV. Em uma dessas atuações, conhece Grande Otelo (Nando Cunha) e ele acaba lhe dando o apelido que o tornaria conhecido no Brasil inteiro: Mussum.
O filme mostra como ele chamou a atenção de outros humoristas, como Chico Anysio (Vanderlei Bernardino), que o convida para participar da “Escolinha do Professor Raimundo”, na década de 1970. Mais tarde, Renato Aragão (Gero Camilo) o contrata para fazer parte dos Trapalhões, que ainda incluiria Dedé Santana (Felipe Rocha) e Mauro Gonçalves (Gustavo Nader).
Luiza Rosa, Cacau Protásio e Yuri Marçal numa cena de ‘Mussum – O filmis’
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Com o programa humorístico, a carreira de Mussum decola de vez e ele fica mais envolvido com a TV e o cinema, mesmo querendo manter a parceria com os Originais do Samba. Na trama do filme, isso o leva a ter conflitos com várias pessoas, incluindo um dos integrantes do grupo, Bigode (Angelo Fernandes/Édio Nunes). O sucesso o leva ainda a se aproximar ainda mais com sua escola de samba do coração, a Mangueira.
Cacildis! Que históris!
“Mussum – O filmis” amarra bem histórias não tão conhecidas da vida do comediante. Grande mérito disso vem da boa direção de Silvio Guindane (ator de séries como “A Divisão” e “Vai que cola”, disponíveis no Globoplay).
Mussum (Ailton Graça) participa da Escolinha do Professor Raimundo numa cena de ‘Mussum – O filmis’
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Em sua estreia como diretor, Guindane mostra desenvoltura nos momentos mais cômicos e nos mais dramáticos, como se já fosse um diretor veterano.
Um bom exemplo é o simbolismo que ele cria ao colocar o personagem, ainda criança, em cima de um muro em que precisa decidir se cai para o lado do samba, ou se joga para onde está sua mãe, que o quer longe desse mundo.
Guindane acerta em mostrar o conflito que Mussum teve desde criança e que o seguiu por toda a vida: se iria atrás de um sonho ou se conformava com uma realidade mais “segura”.
Ailton Graça (à direita) em número musical de ‘Mussum – O filmis’
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Outro bom momento é a cena em que Carlinhos ensina a sua mãe como ler e escrever. A sequência é bem construída e emocionante no tom certo. Outro cineasta poderia ser tentado a fazer um melodrama barato, o que não acontece aqui.
O roteiro assinado por Paulo Cursino é bem construído e com bons diálogos entre os personagens. A narrativa não é inovadora, mas entrega o que é esperado de uma boa cinebiografia. Nesse ponto, faz lembrar a recente “Nosso sonho”, sobre a dupla Claudinho & Buchecha. A simplicidade para se contar uma história às vezes é o suficiente.
Além disso, Cursino não santifica o humorista e não esconde suas fraquezas. Há cenas sobre sua infidelidade com as esposas, por exemplo.
Show de nostalgia
Ailton Graça (Mussum), Gero Camilo (Renato Aragão), Felipe Rocha (Dedé Santana) e Gustavo Nader (Zacarias) são Os Trapalhões de ‘Mussum – O filmis’
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A recriação de época é outro grande acerto de “Mussum – O filmis”. A equipe técnica mostra grande esmero nos detalhes para refazer momentos marcantes da carreira do humorista. Seja no figurino ou na caracterização, tudo está no lugar certo e no tom ideal.
Assim, os números musicais dos Originais do Samba, que cantaram com outros artistas como Elza Soares (Larissa Luz) ou Jorge Ben (Ícaro Silva) estão sensacionais. Mas o que leva o público (em especial o que viveu o auge dos Trapalhões) a uma viagem ao passado é o quarteto em ação, em esquetes recriados com fidelidade.
Mussum (Ailton Graça, ao centro) junto com Os Originais do Samba em ‘Mussum – O filmis’
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Não foi por acaso que um dos seis Kikitos que o longa ganhou no Festival de Gramado de 2023 foi o de Menção Honrosa pela caracterização feita por Martin Macias Trujillo. Esses momentos são tão bem filmados, que é uma pena que sejam tão poucos.
Uma das coisas que o filme fica devendo é mostrar mais detalhes da relação de Mussum com os outros Trapalhões e os motivos que levaram ao desgaste do grupo, que chegou a se separar por um tempo. Esses momentos existem no longa, mas poderiam ser melhor explorados.
Ailton Graça vive seu primeiro protagonista no cinema em ‘Mussum – O filmis’
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Diversão nada atrapalhada
O maior acerto de “Mussum – O filmis” é o elenco, em especial a acertadíssima escolha de Ailton Graça para viver o primeiro protagonista de sua carreira. O ator, que já tinha feito bons trabalhos em filmes como “Carandiru”, talvez entregue aqui sua melhor atuação. Em alguns momentos, ele praticamente “incorpora” o cantor e humorista de um jeito que não dá para distinguir quem é quem.
Graça se mostra um craque para fazer as pessoas rirem. Ele vai bem melhor do que em outras comédias das quais participou. Dessa forma, honra a memória e o legado que o verdadeiro Mussum deixou após a sua morte, em 1994, durante uma cirurgia de transplante. Sem uma performance tão boa, provavelmente “Mussum – o filmis” perderia parte do impacto.
Mussum (Ailton Graça) e sua mãe, Dona Malvina (Neusa Borges) numa cena de ‘Mussum – O filmis’
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Além do protagonista, o elenco conta com ótimas atuações de Cacau Protásio e Neusa Borges, vivendo a mãe de Mussum em fases diferentes. Protásio mostra que pode fazer boas cenas dramáticas e não só cômicas. Borges repete a boa parceria que teve com Ailton Graça na novela “América” (2005), quando também viveram mãe e filho. O trabalho dos dois foi lembrado em Gramado, quando ganharam os Kikitos de Melhor Ator e Melhor Atriz coadjuvante.
Além desses prêmios, “Mussum – o Filmis” levou as estatuetas de Melhor Filme pelo Júri Oficial, Melhor Filme pelo Júri Popular, Melhor Ator Codajuvante (Yuri Marçal) e Melhor Trilha Musical. Todos são justos. O filme é bem-sucedido em manter viva a memória do saudoso Trapalhão para quem já o conhece e faz uma boa apresentação do comediante para um novo público. Uma tarefa que apenas boas cinebiografias conseguem cumprir.
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