Mãe da filha de ex-senador foi assassinada três dias antes de depor em audiência sobre estupro


Antônia Araújo foi assassinada com um tiro na cabeça no dia 29 de setembro, quando saía de casa, na zona Oeste de Boa Vista, capital de Roraima. Audiência estava marcada para o dia 2 de outubro. Senador Telmário Mota é alvo de operação que apura morte de Antonia Araújo de Sousa, mãe de uma filha dele
Reprodução/Senado Federal e arquivo pessoal
A mãe da filha do ex-senador Telmário Mota, Antônia Araújo de Sousa, de 52 anos, foi assassinada três dias antes de prestar depoimento no processo em que a filha acusava ele de estupro. Apontado pela Polícia Civil como mandante do crime, Telmário foi preso em Nerópolis (GO), na noite desta segunda-feira (30).
Na investigação, a Polícia Civil destacou que Antônia seria ouvida no dia 2 de outubro de 2023. Três dias antes, no dia 29 de setembro, ela foi assassinada com um tiro na cabeça na frente de casa, quando saia para trabalhar.
“Com a apuração dos fatos, foi apontado o ex-Senador da República, Telmário Mota de Oliveira da morte da vítima Antônia Araújo Sousa, com que tem uma filha. Ocorre que […], filha da vítima com o Representado Telmário, acusou o pai de estupro, quando ainda tinha 17 anos, no ano de 2022, originando aos autos nº […]”, cita trecho do pedido de prisão, e incluiu:
“A audiência havida sido designada para o dia 02 de outubro do corrente ano. A morte da vítima, mãe de […], testemunha chave neste processo, certamente beneficiaria Telmário”.
A juíza Lana Leitão Martins, da 1ª Vara do Tribunal do Júri, acatou o pedido e ordenou a prisão de Telmário Mota, do sobrinho dele, Harrison Nei Correa Mota, conhecido como “Ney Mentira”, investigado por responsável por organizar a execução do crime, e de Leandro Luz, que atirou em Antônia. A assessora do ex-senador, Cleidiane Gomes Costa, também é investigada e deve usar tornozeleira eletrônica.
“Não se pode negar que o Representado Telmário Mota de Oliveira, é ex-Senador da República, pertencente a família tradicional, que ainda exerce de influência política no Estado. A investigação demonstra que o Representado se desfez de provas, ao determinar que Cleidiane apagasse imagens contidas em seu DVR e HD de imagens de sua residência, inclusive, ordenando a troca de celular. Diante de todo o contexto, a sua decretação de sua prisão temporária é a medida que se impõe”, destacou a magistrada na decisão.
O g1 tentou contato com Telmário Mota para que ele se manifestasse sobre a operação, mas não havia tido retorno até a última atualização desta reportagem.
Saiba quem é Telmário Mota, ex-senador investigado por mandar matar a mãe de sua filha
No dia do crime, Telmário divulgou uma nota à imprensa em que se dizia ter recebido com consternação a notícia da morte de Antônia. À época, ele afirmou jamais ter “qualquer sentimento de vingança com relação. Relembre:
“Esclareço para aquelas pessoas que de forma sórdida estão usando uma tragédia de tamanha natureza para atacar a minha imagem que, apesar das acusações falsas contra mim, jamais tive rancor, raiva ou qualquer sentimento de vingança com relação à Sra. Antônia. Espero que as autoridades policiais adotem todas as medidas necessárias para o devido esclarecimento e punição do(s) responsável(is) o mais rápido possível”, disse ele em nota divulgada no dia 29 de setembro.
Polícia faz operação para prender ex-senador
O nome da operação “Caçada Real” faz referência ao nome da fazenda de Telmário, onde, de acordo com documentos obtidos pela Rede Amazônica sobre a investigação, ocorreu a reunião que decidiu sobre a morte de Antônia.
“Muitos elementos de informação indicando que houve um planejamento da execução, houve uma logística necessária, o nome da operação se reporta a um local onde houve não apenas o planejamento, não apenas reunião do grupo como também até um treinamento antes da execução. Então, ‘Caçada Real’ na verdade diz respeito a fazenda do ex-senador Telmário Mota”, disse o delegado do caso, João Evangelista em coletiva de imprensa.
Foi na propriedade, conforme a Polícia Civil, que Telmário deixou o sobrinho Ney Mentira como responsável pela execução do crime. A fazenda foi um dos locais alvos de busca na operação.
Na operação, Leandro Conceição, responsável por atirar na vítima foi preso. Cleidiane Gomes da Costa, assessora de Telmário também foi um dos alvos da operação. A juíza do caso ordenou que ela seja monitorada por tornozeleira eletrônica. Ela chegou a monitorar a vítima e a filha de Telmário dias antes do crime.
A operação da Polícia Civil ocorre com apoio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) Departamento de Inteligência Secretaria de Segurança Pública, Grupo de Ações Táticas Especiais (Gate) da Polícia Militar e da Divisão de Inteligência Policial da Polícia Civil do Distrito Federal.
Acusação de estupro
Adolescente de 17 anos, filha de Telmário Mota, denuncia o senador por tentativa de estupro
Caíque Rodrigues/g1 RR
Em agosto de 2022, a filha de Telmário e Antônia Araújo — assassinada com um tiro na cabeça no dia 29 de setembro — afirmou que ele a assediou, tocou em suas partes íntimas e tentou arrancar a sua roupa no Dia dos Pais. Na época, ela tinha 17 anos.
Segundo a filha, ela fez contato com o senador para os dois passarem o Dia dos pais juntos. Ela disse que o pai ligou por volta das 19h dizendo que iria levá-la para um lago, para comemorarem a data.
A filha, em entrevista exclusiva ao g1, contou que o pai a forçou entrar em seu carro e a tomar bebidas alcoólicas. Também disse que o senador tomou seu celular durante os assédios para que ela não pedisse ajuda para ninguém.
“Por ele ser meu pai, por eu ter saído várias vezes com ele eu nunca imaginei [que isso aconteceria]. Desde pequena a gente mantinha contato, ele era distante, mas eu era a filha mais próxima dele. Ele nunca tinha dado sinal de um comportamento assim comigo, nunca. Nem para mim, nem para as outras filhas dele. Abalou todo o meu mundo”, disse.
Telmário negou as acusações e afirmou se tratar de perseguição politica.
O caso foi registrado na Polícia Civil como estupro de vulnerável. A juíza Graciete Sotto Mayor Ribeiro, da Vara de Crimes Contra Vulneráveis, chegou a conceder uma medida protetiva em favor da filha.
Morte de Antônia
O corpo de Antonia Sousa foi removido pelo Instituto Médico Legal (IML)
Caíque Rodrigues/g1 RR
Antônia Araújo de Sousa, mãe da jovem, foi morta com um tiro na cabeça quando saia de casa no dia 29 de setembro, no bairro Senador Hélio Campos, zona Oeste em Boa Vista.
Ela estava dentro de um carro com um parente na calçada de casa, por volta das 6h30, quando dois homens chegaram em uma motocicleta. Um deles a chamou e em seguida atirou em Antônia.
Antônia morreu ainda no local, na calçada de casa. No local do crime, a filha da vítima prestava esclarecimento aos agentes com as roupas cobertas de sangue. A vítima era servidora do Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami e Yek’uana (Dsei-YY), desde 2017.
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